sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

edital oraci gemba


em setembro a jornalista helena carnieri publicou no caderno g da gazeta do povo uma matéria sobre o edital oraci gemba do fundo municipal de curitiba que seleciona dramaturgias prontas e propostas de escrita para publicação.
no último edital fui premiada junto com os colegas luiz felipe leprevost, diego fortes e mais 3 dramaturgos e nossas dramaturgias publicadas na coleção dramaturgias curitibanas lançadas no festival de teatro de curitiba deste ano. o edital não foi lançado em 2013 e, de acordo com a fundação cultural de curitiba está sofrendo alterações e somente será publicado novamente em 2015.
diante deste fato, na matéria falei um pouquinho sobre a importância deste edital e a publicação de dramaturgia no brasil.
 

 

onde começa o teatro

fundação cultural garante continui­dade de projeto de publicação de textos de peças, mas próxima edição pode sair só em 2015

a recente empolgação nacional com os novos dramaturgos curitibanos, especialmente no contexto do núcleo de dramaturgia do sesi/pr, pode dar a falsa impressão de que só agora passamos a escrever. nada disso. profissionais atuantes desde a década de 80, como sílvia monteiro, lembram que nossos grupos se autopautavam há muito tempo. “nossa dramaturgia é silenciosa, mas presente”, define.
essa produção passou a ser documentada em 2007, por meio do edital oraci gemba, da fundação cultural de curitiba. foram quatro livros, trazendo peças inéditas produzidas por aqui.
a dúvida da classe sobre a continuidade do programa de incentivo nesta nova gestão municipal se dissipou parcialmente em reunião com o presidente da fundação, marcos cordiolli, que garantiu o retorno do projeto. mas a perspectiva temporal não é animadora: primeiro, será realizada uma nova rodada de conversas com a classe artística sobre a reformulação dos editais, para só então lançá-lo, o que poderia ocorrer em 2015. “depende de estudos técnicos. mas nos interessa a produção de literatura e de dramaturgia locais”, assegurou cordiolli em entrevista à gazeta do povo. segundo ele, o formato bienal, com a publicação de mais textos num único livro, é interessante.

memória

a última edição do dra­­ma­­turgias curitibanas (2011/2012) reuniu cinco textos. alguns já tiveram leituras dramáticas, como o beijo, de sílvia. “foi meu primeiro texto com ideia original, sem ser uma adaptação”, revela a autora, que tem experiência na área. quando ela criou o grupo delírio, na década de 80, com edson bueno e áldice lopes, as peças frequentemente tinham dramaturgia própria. “poderíamos acompanhar o movimento de teatro de grupo da cidade pelos textos produzidos, seguindo o pensamento por trás dos espetáculos.”
por isso, a publicação é vista como fundamental para a manutenção da memória da cena teatral curitibana, mas também para estimular a criatividade e a produção original.
“que eu conheça, [o oraci gemba] é o único projeto no brasil que incentiva a criação dramatúrgica, sem ser simplesmente um concurso”, contou à reportagem o autor e diretor enéas lour. ele publicou nas duas últimas edições: reivalino e dagobé (ambos os dois assassinos contratados), no livro de 2009, e otto e maria, no de 2011/2012.
a pesquisadora lígia souza oliveira, que publicou encontros diários na última edição do dramaturgias curitibanas, é uma defensora ferrenha da publicação de textos de peças – e do estímulo a sua leitura. criou o blog habitando o papel com esse objetivo, e direcionou seus trabalhos de mestrado e doutorado para essa área.
tendo acompanhado a criação de textos feitos no calor de um processo de montagem de espetáculo, ela acredita que um “texto de gabinete”, escrito independentemente pelo dramaturgo, tem suas vantagens. “há um exercício de linguagem mais profundo. por outro lado, é preciso encarar as palavras enquanto fala”, disse à reportagem.
outra alegria trazida pelo projeto à classe, na opinião de lígia, é a reunião de nomes iniciantes – como o dela própria, além de diego fortes e luiz felipe leprevost – ao da geração mais experiente, como sílvia, enéas, renato perré e luiz roberto meira.

discussão

a revisão dos editais municipais para a área cênica ainda não tem prazo para começar. por enquanto, foram realizados dez encontros com artistas da cidade de várias áreas. um dos interesses manifestados por cordiolli é o de investir em editais integrados, que pensem a produção e a circulação – inclusive nacional e internacional – de espetáculos.
um dos principais editais da área de teatro, o de ocupação do teatro novelas curitibanas, terá sua nova edição até o fim de ano, promete cordiolli.

 

 


relato de experiência - oficina de iniciação à dramaturgia


a convite da ciasenhas de teatro ministrei em julho três oficinas de iniciação à dramaturgia na periferia de curitiba para crianças e adolescente de 10 a 15 anos. as oficinas compuseram a contrapartida social do projeto do livro da dramaturga e diretora - e mestra e amiga - sueli araújo que foi lançado no mês de agosto em curitiba – narrativas em cena. 
amedrontada principalmente pela falta de preparo e experiência com esse público, aceitei a aventura e parti pra curitiba numa tarde ensolarada em são paulo, e a paisagem da chegada - um céu azul dilacerante - me enganava do frio típico de curitiba.
os locais das oficinas - uma associação de moradores, um centro de integração e um por fim um centro de assistência social - eram localizados em bairros muito distantes, onde dois deles tinham como vizinhos a mata de araucárias até o infinito. sete anos morando na cidade e nenhuma vez perambulei por essas regiões. ironia ou não, precisei sair de curitiba para então conhecer esses recantos.
as crianças eram todas muito desconfiadas, mas com o carinho e a dedicação dos professores/educadores me senti acolhida e a vontade, o que provocou uma catarse bonita e doce.
no começo pedi pra cada um se apresentar e dizer o que mais gostava de fazer, um hobby, para que eu pudesse conhecer um pouco o universo daquelas crianças e para que as suas particularidades pudessem me tocar um pouco, apesar do pouco tempo da oficina.
logo de cara percebi que o mais importante era mostrar que eles podiam, deviam, se sentir a vontade. a cumplicidade para começarmos uma oficina de escrita – algo tão pessoal e obscuro - era necessária desde o início. portanto declarei as duas primeiras regras: não existia certo ou errado nos textos que iríamos produzir e ninguém seria obrigado a ler seus textos, somente quem se sentisse a vontade - afirmação que provocou uma tranquilidade geral: ok, agora podemos começar!
começamos então a conversar sobre o que era dramaturgia. com palpites e achismos à vontade, fomos construindo coletivamente essa ideia e da mesma maneira também conversamos sobre a narrativa e também sobre a poesia. ao longo do dia fomos criando e descobrindo também como a fronteira entre esses gêneros foram sendo destruídas.
a primeira proposta de escrita foi livre e libertadora, todos nós escrevemos através da escrita automática durante alguns minutos, no qual não há nenhum filtro e nenhuma racionalização. sempre começávamos com “eu não sei o que escrever”, mas a ideia era não parar, não desistir. e então personagens, espaços, tempos, temas e universos inteiros eram criados. já éramos escritores.
passamos para a próxima conversa. o que é uma história? mais uma vez o quadro ficou repleto de definições, muitas vezes antagônicas, como eu esperava que fosse. e então o desafio: vamos tentar escrever um texto sem história. sim, detectamos que era impossível e que uma notícia de jornal era uma história, uma bula de remédio era uma história ou uma mínima palavra.
até que nesses desdobramentos ele surgiu: o leitor!
subíamos um degrau. conversamos sobre o leitor e também sobre o espectador e então voltamos para a dramaturgia. seguimos toda a oficina fazendo experimentações com e sobre a palavra e o mais importante, sobre nós mesmos, que nos expusemos e nos desafiamos a lermos nossos textos, ou ainda a interpretar o texto do meu amigo do lado, reescrevendo sua história, não entendendo ao certo sua intenção e até mesmo xingando sua letra: o escritor encontrou seu primeiro leitor.
desenvolvemos o diálogo e a narração dentro dessa história que construímos na escrita automática. por fim, ao falar do lírico, falamos do que há de mais particular e escondido em nós mesmos! éramos cúmplices naquele momento.
falamos sobre família, sobre sonhos, sobre futebol, sobre roubos, mortes, amigos, sobre a escola, sobre o primeiro beijo, funk, vídeo game e também sobre aquela vez em que ele foi com o melhor amigo ao lago no fundo daquela mata, várias vezes escondidos de suas mães. até que o melhor amigo, morreu: leptospirose. sim, a culpa era minha. porque ele e não eu? ele era meu melhor amigo...
só me entregava seus textos quem quisesse. minha mochila voltou pra são paulo cheia de histórias, uma nova a cada palavra. mas essa, a história do melhor amigo, não. ele levou consigo o pedaço de papel. aquele papel era um pedaço dele mesmo, não poderia mais viver sem aquelas palavras. nem eu.
e foi por isso aquele pedaço de papel veio para cá.

 
obrigada curitiba

obrigada ciasenhas de teatro pela oportunidade.

 
 
evoé dramaturgia
 
sempre...