quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

aqui - martina sohn fischer




a dramaturgia aqui de martina sohn fischer faz parte da coleção dramáticas do transumano com curadoria do dramaturgo e diretor roberto alvim e lançada pela editora 7letras. o texto de martina é acompanhado no mesmo volume por happycínio de angélica rodrigues.

a idéia da coleção é apresentar dramaturgias que se ligam ao conceito de dramáticas do transumano, ao qual, alvim propõe a criação de outro teatro não ligado somente às modulações de tempo e espaço, antes disso, o conceito propõe a transformação do sujeito o qual povoa a obra dramática. portanto, definindo de maneira rápida, as produções que compõem essa coleção partem de uma nova experimentação do tempo e espaço a partir de outras possibilidades de habitá-los, numa uma outra percepção, fora das condições enquadrantes do ser humano.

aqui está localizada neste contexto.

a primeira observação que podemos levantar acerca da dramaturgia de martina, se dá, justamente, na formatação que o texto propõe. divido em oito tempos, o texto se liberta do formato tradicional da dramaturgia (falas e rubricas) e se envereda por questões já tão exploradas pela poesia concreta por exemplo, mas extremamente raras nas experimentações da escrita teatral: a visualidade da palavra no papel. inovadoras não só por sua raridade, mas principalmente por adicionar a libertação da palavra na página à questões ligadas à oralidade e à configuração dos sujeitos no teatro.






essa percepção se dá principalmente na separação do texto por grafias diferentes, propondo que, independentemente da quantidade de emissores, se trata principalmente de vozes contrastantes,  de percepções antagônicas que nos fazem questionar a existência de um personagem, de um ser ao qual estamos acostumados a encontrar na dramaturgia.

além disso, a visualidade da palavra no papel também nos propõe um ritmo de leitura, assim como modulações de altura, intensidade e velocidade, ressaltando uma das proposta de dramaturgia: a que se trata da fala, não enquanto comunicação, mas antes de tudo, enquanto fisicalidade, sonoridade presencial.

aparte essas questões, o texto nos mostra a relação de um eu com um corpo fora dele próprio, que a ele retorna, ao pó. por vezes ele o pertence: “meus pés separados do corpo”, em outras este corpo se relaciona como um outro: “eu quero possuir o corpo de vidro”; mas sempre propondo uma experiência fora das relações intersubjetivas ou das relações com o inconsciente. essas configurações se mostram como pós (ou pré?) humanas, mas sempre torcendo, contestando, e portanto se esbarrando na própria condição de ser, com suas perspectivas carnais, da ordem do excremento, do orgânico, do físico que existe no humano. a repulsa não é à carne e sim ao ordinário.

não é só uma inovação no campo da palavra no teatro, aqui renova o  entendimento físico, da ordem do orgânico, o sopro das relações do ator e do leitor com a palavra. a troca realizada com texto transpõe a interpretação de uma fábula e nos propõe a interação física, sonora e orgânica com essas palavras. aqui traz a palavra enquanto presentificação, estado evocado não somente no palco, mas também na leitura, no ato de fazer estas palavras presentes neste momento, aqui. 

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